CATEQUESES DE D. VIRGÍLIO ANTUNES - JMJ 2011

Nas Jornadas Mundiais da Juventude 2011, o Bispo de Coimbra, D. Virgílio Antunes, ministrou duas catequeses para os jovens de língua portuguesa, motivando-os a “celebrar a fé e a aprofundar a intimidade com Cristo e o amor pela humanidade”.

 

JORNADAS MUNDIAIS DA JUVENTUDE DE MADRID

1.ª CATEQUESE – FIRMES NA FÉ – 17.08.2011

 

Parroquia Santa Catalina de Siena, C/ Juan de Urbieta, 57 28007, MADRID

 

 

LUGAR DA FÉ

É convicção comum a ideia de que o mundo está nas nossas mãos, que a construção de uma sociedade justa e equilibrada depende de nós e que a felicidade é uma conquista pessoal. Estas são algumas das conclusões da cultura moderna que afirma o homem como senhor de si mesmo, do seu presente e do seu futuro. Se o homem se basta, não há lugar para Deus, nem para a religião, nem para a fé.

 

É comum encontrarmos famílias que se constroem com base no pressuposto de que o presente é tudo o que temos. O trabalho, a escolaridade dos filhos, o fim de semana, as férias, a actividade profissional, alguma preocupação com o futuro no sentido de prever os meios económicos para não ser pesado a ninguém... basta. Cada vez mais, nas sociedades modernas, a questão do sentido da vida é a questão da resolução dos problemas quotidianos, é uma questão pragmática de viver com os meios necessários. As questões filosóficas e a procura de respostas para as grandes questões existenciais, como o donde vimos e para onde vamos, o sentido da nossa vida, são adiadas ou relegadas para segundo plano, por não se perceberem como fundamentais no plano imediato.

 

As pessoas continuam a preocupar-se com a felicidade, mas numa perspectiva imediatista, agora, sobre esta terra que pisamos, sem qualquer tipo de preocupação com uma felicidade que possa ter continuidade fora deste espaço e deste tempo, inclusivamente porque deixaram de acreditar na vida para além da morte.

 

Numa cultura onde tudo depende de nós e está nas nossas mãos, onde a felicidade é algo que conquistamos e depende dos nossos sentimentos ou das realidades que nos cercam, acaba por não ter sentido falar de Deus, pois Ele descentra-nos de nós mesmos, aponta para horizontes de realização que passam pela abertura aos outros, fala de projectos de felicidade terrena e eterna – a vida para além da morte -, diz que o homem é limitado e pecador, portanto necessitado de auxílio, força, capacidade de realização.

 

O cristão, cada um de nós, todos os dias convive com pessoas desprovidas de outras preocupações que não sejam o que sentem, o que fazem, o que gostariam de fazer, o modo como quereriam aproveitar a vida, na procura desenfreada de felicidade imediata. Todos os dias contactamos com pessoas que estabeleceram um corte com Deus, que se fixam exclusivamente em si mesmas e no tempo presente. Dá-se um certo choque de perspectivas e mentalidades, difícil de suportar, pois originante de duas diferentes atitudes face às realidades mais banais. Como forma de ultrapassar este confronto, proveniente de um modo de encarar a vida a partir da fé ou na ausência dela, relega-se a fé e a religião para o plano privado, o único lugar onde elas deixam de incomodar seja quem for.

 

A fé tornou-se uma questão exclusivamente do foro íntimo. A religião algo do domínio privado. Como se de um comum acordo se tratasse para bem da paz entre as pessoas e para que ninguém se sinta incomodado, estes temas tornaram-se tabu e não se fala deles. É frequente ouvir-se dizer num grupo de amigos: aqui não entram religião e política (partidária, entende-se), por serem duas realidades que pertencem ao âmbito privado, que são uma opção que não precisa de ser explicada nem questionada por ninguém.

 

Muitos dos jovens aqui presentes têm inúmeros amigos cujas convicções religiosas não conhecem. Todos temos noção dos inúmeros subterfúgios utilizados no facebook e outras redes sociais para a pessoa se não declarar do ponto de vista religioso: creio no ser humano; creio na bondade, na beleza e no amor; creio na paz...

 

 

DEUS E A FELICIDADE

Será que é possível ser feliz sem Deus? Não bastarão os outros como interlocutores da nossa felicidade?

 

Que é impossível viver e ser feliz sem os outros faz parte da nossa experiência quotidiana, é algo que entra pelos olhos. Dos pais aos outros familiares, estamos marcados por um conjunto de relações de interdependência a todos os níveis, que não poderíamos sobreviver sem eles. Ao nível do próprio equilíbrio emocional, da amizade e do amor como condições de sobrevivência psicológica, os outros são essenciais e toda a gente normal o percebe. A solidão é o pior inimigo do homem e a realidade que mais nos atemoriza em todas as fases da vida, porque as relações interpessoais são como o pão para a boca.

 

Mais difícil é perceber o lugar de Deus na construção da nossa felicidade, porque Ele é discreto, não se impõe e age a partir de dentro. No entanto, é impossível construir uma felicidade plena sem Deus, porque impossível construí-la desligados da fonte da vida e da felicidade que é o Seu amor de Criador e de Salvador.

 

A grande dificuldade que hoje se vive está em reconhecer Deus como a fonte da vida, da bondade, da felicidade e do amor. Toda a gente fala destas realidades e as procura, mas pensa encontrá-las nas coisas deste mundo, na profissão de uma espécie de materialismo prático, que substitui o Deus vivo e verdadeiro revelado por meio de Jesus Cristo.

 

O grande problema da sociedade de hoje consiste em esquecer o Deus vivo e em o substituir por ídolos, realidades transitórias e perecíveis, que não podem preencher as ânsias que existem no coração humano.

 

Um dia encontrei uma pessoa que estava com grandes sofrimentos físicos. Dizia que lhe custava muito a aguentar as dores, mas o que mais a fazia sofrer era não saber por quê nem para quê servia o seu sofrimento. Quando acreditou que vinha de Deus e para Ele caminhava, mesmo no meio do sofrimento, começou a sentir-se feliz, pois entendeu o sofrimento como algo com um sentido, como caminho para a felicidade que estaria no fim do percurso.

 

 

A FÉ EM JESUS CRISTO

A experiência de vida de alguns convertidos ajuda-nos a compreender o modo como a fé cristã transforma a vida dos crentes. O exemplo mais notório do Evangelho é o de Zaqueu, aquele que procurava ser feliz recorrendo aos bens materiais, os seus e os dos outros. É o modelo da pessoa sem valores, sem critérios, sem consciência e sem moral, que se serve dos outros e até se pode servir de uma ideia errada de Deus para alcançar os seus objectivos. Uma vez convertido, passa a procurar a sua felicidade noutro lugar e noutra pessoa, a ponto de servir os irmãos e servir a Deus com tudo o que é e tem.

 

A nossa própria experiência de vida, o que nos diz? Se nascemos dentro de uma tradição cristã e absorvemos a fé desde crianças, pode acontecer que ela faça parte de nós como uma questão cultural, porventura pouco assumida. Apesar disso, no mundo em que vivemos, já não é possível viver a fé cristã sem de algum modo a assumir, porque o ambiente é-lhe adverso. Nas nossas escolas, nos lugares onde os jovens se divertem, no grupo alargado de amigos, às vezes até nas famílias, já não se respira a fé como uma questão cultural. Manter-se fiel à fé na Igreja é, hoje, uma opção que exige clarividência, convicção, experiência de encontro interior com Cristo.

 

Todos nós que aqui nos encontramos, já tivemos, por isso, momentos fortes na vida em que a decisão se impôs; já ouvimos a voz de Jesus que nos disse, vem e segue-Me; já tivemos a tentação de desistir e de pôr de lado o Deus que nos ensinaram a conhecer e a amar; já pensámos que sem Ele seríamos mais livres e talvez mais felizes por podermos desfrutar mais da vida. No entanto, a voz do coração tem sido mais forte, a força do amor de Deus tem-se sobreposto ao egoísmo humano, os momentos de paz interior e de segurança nos braços de Deus ajudaram-nos a ultrapassar todos os momentos de crise, de dúvida e insegurança.

 

Quem alguma vez experimentou o amor de Deus, nunca mais consegue esquecê-lo, mesmo que à sua volta tudo sinta as coisas de maneira diferente. Um filho que se sente acolhido amparado e perdoado pelo Pai, nunca mais pode ignorar esse gesto, porque nunca conseguiu uma felicidade maior do que a que lhe veio do coração de Deus.

 

 

CAMINHOS PARA UMA FÉ FIRME

A ânsia incontida de independência própria dos jovens faz deles as pessoas mais vulneráveis ao avanço da descrença e afasta-os frequentemente de Deus.

 

É muito difícil para um adolescente ou para um jovem harmonizar na estruturação da sua personalidade a afirmação do seu eu, do tu dos outros, e do próprio Deus.

 

Esse desejo de independência juntamente com a permeabilidade à cultura ambiente leva frequentemente ao abandono da fé cristã na fase juvenil. Perde-se nessa altura a afeição pela Igreja, dissipa-se a ligação à comunidade cristã que celebra a Eucaristia e os outros sacramentos. Fica, quando muito, uma ténue ligação interior a Deus, que se manifesta na oração de acção de graças ou petição nos momentos de dificuldade.

 

O avolumar-se das preocupações com o estudo, o trabalho e as muitas ocupações da vida associativa, cultural, desportiva... encerram cada vez mais o jovem na procura de resolução das questões imediatas e fecham-lhe os horizontes mais vastos. Frequentemente, com esse desejo incontido de independência chegam também as experiências limite, de quem quer conhecer e experimentar tudo o que a vida pode dar, sem regras, sem critérios e sem limites impostos por nada nem ninguém. Muitos acabam por perder-se enredados nas teias das dependências dificilmente transponíveis, causadoras de muitos sofrimentos aos directamente implicados e aos que com eles convivem.

 

Que caminhos percorrer para nos mantermos firmes na fé?

 

Em primeiro lugar está a abertura do coração a Cristo, que nos fala ao coração, que nos chama, nos ampara e perdoa. Há um diálogo de amizade que tem lugar dentro de nós desde crianças e que pode perdurar, se amadurecer com o passar dos anos e com o crescimento cultural e intelectual.

 

Há um mistério de relação entre Deus e cada um de nós, que tem uma história, que constitui quase um segredo e que é fundamental, pois é só nosso, tem a ver com o que somos e sentimos no mais íntimo de nós mesmos, faz parte da nossa identidade.

 

Sem este caminho interior, construído no mais fundo de nós mesmos onde se define o que somos, não há uma fé que perdure firme, pois ela é dom de Deus e nasce de dentro, no coração, onde se cruza o amor de Deus coma nossa capacidade de amar.

 

Em segundo lugar está a abertura do coração aos outros, na renúncia ao egocentrismo e egoísmo e na procura da entrega e doação por amor. Não há fé cristã que não conduza ao serviço dos outros, à semelhança de Jesus Cristo que serve até à morte de cruz. Toda a generosidade, amizade, amor realizado no serviço dos outros, é caminho de fortalecimento da fé, e toda a atitude de egoísmo conduz à idolatria de si mesmo ou das coisas que ocupam o lugar dos outros e de Deus.

 

Em terceiro lugar está a vida em comunidade cristã, em Igreja, suporte insubstituível da fé cristã. Quem não celebra a Eucaristia não escuta a Palavra do Evangelho, não recebe como alimento o Pão da Vida, não partilha dentro da comunidade de irmãos, começa rapidamente a arrefecer na sua fé, que não pode ser vivida no isolamento, por ser essencialmente comunitária.

 

No caso dos jovens é imprescindível o esclarecimento adulto e lógico das verdades da fé e da Escritura, numa linguagem acessível, mas adaptada ao seu nível cultural e intelectual. Não lhes basta, por isso, a catequese que tiveram na infância, nem porventura a apresentação feita pelos seus pais; por meio da leitura, de algumas conferências ou debates, precisam de unir à experiência celebrativa a dimensão intelectiva.

 

A participação na vida de grupos juvenis onde se celebra, se canta, se reza e que realizam actividades em favor dos outros, ajuda a moldar o coração ao amor de Deus que nos fortalece, nos torna felizes e nos ajuda a conhecer o verdadeiro sentido da vida.

 

Na sua carta para esta XXVI Jornada Mundial da Juventude o Papa Bento XVI recorda-nos que “a fé é antes de mais uma adesão pessoal do homem a Deus”. Se, de facto o nosso coração aderir a Deus, por meio de Jesus Cristo nosso irmão e nos deixarmos seduzir sempre mais por Ele, não a perderemos.

 

Neste momento agradecemos a Deus a alegria de nos ter chamado a conhecer Jesus Cristo, nosso irmão e amigo e pedimos que nos torne firmes na fé.

 

 

Coimbra, 13 de Agosto de 2011

Virgílio do Nascimento Antunes

Bispo de Coimbra

 

 

JORNADAS MUNDIAIS DA JUVENTUDE DE MADRID

3.ª CATEQUESE – TESTEMUNHAS DE CRISTO NO MUNDO

 

Parroquia Visitación Ntra. Sra., Pico de los Artilleros, 82 28030, MADRID – 19.08.2011

 

 

A RIQUEZA DOS JOVENS

Os jovens são hoje a grande riqueza da humanidade. Nos países do hemisfério sul pululam as populações jovens, que abrem enormíssimas portas de esperança ao desenvolvimento a todos os níveis. Hão-de operar a passagem de uma situação de pobreza social, moral, económica e cultural para um mundo de progresso. Já se começam a ver sinais dessa mudança em muitos lugares.

 

No mundo ocidental, cada vez mais envelhecido na sua população, mas também nos seus valores, começam igualmente a surgir gerações jovens inconformistas, que rompem claramente com a situação vigente tanto a nível social, como económico, político e até religioso. Chegados ao fundo no desenvolvimento da cultura de morte, de exploração e de afastamento dos valores humanos perenes, as camadas jovens sentem o peso da realidade e começam a reagir. São, por isso, os jovens quem está a modificar a sociedade ocidental e que vão ser os protagonistas da mudança futura.

 

Importante em todo este processo é que haja um equilíbrio capaz de fazer mudar o mundo sem rupturas, sem causar sofrimentos injustos, sem violências nem atropelos da liberdade dos outros, como aconteceu noutras épocas. Os jovens têm de ter a capacidade de fazer a verdadeira revolução das mentalidades e das formas de agir de uma forma absolutamente pacífica, a única que respeita o carácter sagrado do ser humano e de todas as suas iniciativas.

 

Sabemos como a força juvenil mal aproveitada e mal conduzida se pode tornar uma arma de violência e de morte, como tem acontecido inclusivamente no nosso tempo, em alguns lugares e sociedades onde se nota um grande mal estar social.

 

Os jovens estão já a ser protagonistas de uma nova era, conscientes da situação insustentável que se vive e que tornou insuportável para muitos a pobreza, a injustiça, os atropelos contra o direito à vida, contra a unidade familiar, contra o direito ao trabalho, contra a liberdade religiosa e muitos outros.

 

Ao nível da vivência da fé cristã, após um período de fuga e abandono, começam a ver-se alguns sinais de aproximação e renovação. Começam a notar-se novos grupos de jovens ligados a movimentos eclesiais, paróquias, dioceses, que assumem a fé sem preconceitos e com um novo ardor. Estas multidões que se juntam nas Jornadas Mundiais da Juventude, por um motivo de fé, são um bom sinal. Os jovens começam a aperceber-se do sem sentido do mundo em que nasceram e querem transformá-lo.

 

 

CÓDIGO DE VALORES

Acontece que os jovens de hoje são herdeiros de uma sociedade que perdeu a noção da verdade e dos valores autenticamente humanos e cristãos. Os seus pais e avós foram os protagonistas da revolução do vazio, do corte com os valores tradicionais que alimentaram a Europa durante muitos séculos, da ruptura com a cultura judeo-cristã, que foi o húmus básico do crescimento do Mundo Ocidental.

 

Reagindo contra o vazio instaurado e que a sociedade lhes vem a transmitir, os jovens de hoje querem mais, sentem-se defraudados, percebem que os empurraram para um mundo sem valores, sem critérios, sem normas de vida e sem Deus. Sentem a falta de respostas para as suas interrogações existenciais, vêem a sociedade a caminhar para um abismo moral, interrogam-se acerca do valor da vida, das instituições como o matrimónio, a família, a paternidade, o bem comum, os valores espirituais, a religião e a fé.

 

Os jovens de hoje percebem que não há nada pior para uma sociedade do que estar completamente baralhada, sem saber para onde vai, que confunde verdade com mentira, bem com mal, que não sabe nem qual o seu futuro e se vê desprovida por ideais pelos quais lutar. E, no tempo presente, parece que é o que se passa: os próprios jovens, fruto desta sociedade, estudam sem saber para quê e porventura para nada; não constroem família por não terem horizontes largos de uma vida toda mas simplesmente a um prazo muito curto; não investem no futuro porque a cultura é de fruição do momento presente; até receiam ter descendência por medo de não poder dar aos filhos as condições de vida necessárias ao seu crescimento. No mundo das uniões de facto, do divórcio por motivos fúteis, do aborto como solução mais fácil, das uniões homossexuais legalizadas e postas ao nível do casamento, da morte medicamente assistida e de tantos outros atentados contra o ser humano em nome do progresso, batemos no fundo e têm de abrir-se caminhos de renovação e de vida.

 

Neste contexto, ganha novo sentido a notícia do Evangelho, que nos diz que mesmo da morte, Deus pode fazer surgir a vida; ganha um

sentido próximo a boa nova da ressurreição de Cristo e a possibilidade da ressurreição do género humano, autenticamente morto na sua realidade mais profunda; ganha novas possibilidades o código de valores cristãos promotores da verdade, da dignidade humana e de uma autêntica cultura da vida.

 

Neste contexto torna-se urgente o testemunho cristão, protagonizado pelos jovens, por serem quem mais directamente se encontra nos lugares chave para a transformação do mundo, como são as escolas e universidades, os lugares de trabalho, o mundo da ciência e da tecnologia, o mundo da investigação, da saúde, da política.

 

 

TESTEMUNHAS DE CRISTO

No Evangelho segundo S. Mateus, Jesus convida os seus discípulos a ser sal da terra e luz do mundo, isto é, a serem eles mesmos, em seu nome, força transformadora da realidade.

 

De facto, os cristãos, ou são força transformadora do mundo ou são absorvidos pela realidade do mundo e engolidos pela cultura ambiente, pelas ideologias dominantes e pelas práticas de vida mais comuns.

 

Três são os aspectos fundamentais para que os jovens cristãos sejam sal da terra e luz do mundo.

 

Em primeiro lugar precisam de conhecer bem a realidade que os cerca, o mundo em que vivem com os seus valores e contravalores. Precisam de estar possuídos pela convicção de que não serve como caminho de felicidade e de vida para si e para os outros.

 

Hoje, num mundo desenvolvido e onde a massa crítica é pertença fundamentalmente dos jovens, há felizmente, a capacidade para conhecer de forma clara o bem e o mal, os aspectos positivos e negativos que entram pelos olhos dentro através dos inúmeros meios de comunicação disponíveis. Nada do que se passa nas sociedades próximas ou distantes fica escondido, havendo, por isso, a possibilidade de ver e ajuizar sobre tudo. Ninguém está condenado a viver na ilusão acerca do mundo e todos podem conhecer os malefícios das opções tomadas.

 

Em segundo lugar, os jovens cristãos precisam de conhecer a mensagem de Jesus Cristo e ter plena consciência de que é uma proposta válida, de que é a única proposta para a renovação da humanidade e da face da terra. Precisam de compreender intelectual e racionalmente todo o sistema de valores cristãos, enquanto melhor possibilidade de realização, melhor caminho.

 

Uma sociedade que valoriza a razão e as suas possibilidades, particularmente entre as camadas juvenis, somente por motivos de ordem racional aceita fazer caminhos de mudança. Neste sentido, urge facultar aos jovens os meios necessários para racionalmente formarem a sua consciência e o seu coração por meio do conhecimento da fé cristã. Importa, nesse sentido, que saibam que fé e razão não se excluem, que aprendam a ler a realidade à luz da fé e da razão.

 

Em terceiro lugar, os jovens precisam de viver uma paixão forte por Jesus Cristo, de O sentir como o irmão e amigo de todos os momentos, de O ter como o confidente a quem agradecem e suplicam. Esta dimensão vivencial da fé como relação entre o jovem e Cristo é determinante na estruturação da sua vida e na criação da sua capacidade de testemunho. Ninguém pode testemunhar um Cristo que não conhece e que não ama; ninguém empenha o seu trabalho e esforço ao serviço de uma mensagem ou de uma pessoa que o não seduziu.

 

 

COMO SER TESTEMUNHA DE CRISTO

Perguntais frequentemente: como se pode ser testemunha de Cristo numa sociedade tão fechada a Ele, tão desinteressada da fé e tão materialista?

Há um pressuposto fundamental a considerar: a questão está do nosso lado. Não temos qualquer hipótese de escolher o tipo de pessoas com as quais vivemos nem o tipo de sociedade à qual somos enviados a testemunhar Jesus Cristo. São as pessoas e a sociedade existentes à nossa volta e que nós mesmos constituímos. Por isso, a única possibilidade que temos é a de agir sobre nós próprios, transformarmos o nosso coração e a nossa vida e torná-los capazes de ir ao encontro dos outros e do mundo.

 

Frequentemente queremos ir ao encontro dos outros para os transformar e lhes anunciar Jesus Cristo sem que nós próprios tenhamos feito um caminho sério de mudança e de conversão. O resultado é desastroso, porque não se trata de levar um recado que se recebeu, como fiel portador ou mensageiro, mas de testemunhar e fazer passar uma realidade que se vive.

 

Recordemos que Jesus Cristo para nos fazer chegar a mensagem da salvação de Deus teve de dar a sua vida por ela; recordemos que os Apóstolos enviados a testemunhar a Boa Nova do Evangelho tiveram de dar a sua vida pela mensagem que anunciavam; recordemos ainda que os grandes evangelizadores da história do cristianismo foram pessoas totalmente dedicadas à missão recebida. Como nos disse o Papa Bento XVI na mensagem para as XXVI Jornadas Mundiais da Juventude, “na história da Igreja, os santos e mártires tiraram da cruz gloriosa a força para ser fiéis a Deus até à entrega de si mesmos”. Com uma convicção somente à flor da pele não conseguimos levar Cristo aos outros; sem o coração cheio de Cristo não o transmitimos; sem uma disponibilidade que empenhe a vida e aceite o sacrifício, a rejeição, a crítica, a incompreensão, o ser visto como diferente, antiquado ou estranho, não há testemunho que possa passar.

 

No tempo em que vivemos, o cristianismo tornou-se uma questão cultural aceite ou recusada. Mas, enquanto questão cultural não tem força para transformar as pessoas, a sociedade e o mundo. Somente como questão vital muda a realidade a partir de dentro.

 

Jesus Cristo e a fé cristã para nós não são capítulos de uma historiografia que se ensina e que tiveram muita importância na construção do tempo passado; são realidade que molda hoje a nossa vida, da qual podemos falar, porque faz parte de nós.

 

Pressuposto igualmente fundamental é que, para testemunhar Cristo ao mundo, os jovens têm de estar inseridos no mundo. Aliás essa é a

característica da acção própria dos leigos cristãos: participantes de todas as tarefas humanas, ocupados com tudo aquilo que faz parte da vida de homens e mulheres activos, são sinal de algo diferente, que é a marca da sua fé e do seu modo de encarar a vida.

 

Os jovens testemunham a sua fé e anunciam Cristo aos outros jovens partilhando com eles a sua própria vida. Estão onde estão todos os jovens, fazem o que fazem os outros jovens, trabalham, estudam, divertem-se, fazem desporto, constituem famílias, participam nas actividades das associações, doam-se no voluntariado. Em tudo isso, têm uma responsabilidade acrescida, a de nunca perder a perspectiva cristã da vida que lhes dá um entusiasmo maior, mas lhes impõe alguns limites: estão abertos a tudo o que é bom, recto, justo, belo, sinal de amor a Deus e ao próximo; e rejeitam tudo o que é contrário à fé e ao melhor bem do ser humano.

 

O jovem cristão testemunha a sua fé em Cristo pelo modo como vive:

 

participa activamente na vida da sua comunidade cristã, concretamente na celebração da missa do domingo e outros momentos marcantes do ritmo da Igreja;

 

insere-se no grupo de jovens da sua paróquia, de um serviço diocesano ou do seu movimento de espiritualidade;

 

na escola ou no trabalho demarca-se em tudo pela positiva, sobretudo no gosto com que se dedica às funções que tem e na qualidade profissional que põe em tudo o que faz;

 

relaciona-se de forma simples, amiga e fraterna com todos, dando preferência aos mais pobres, ignorados ou desprezados pelos outros;

sem saturar ninguém, aproveita os momentos propícios para fazer conhecer o seu modo de encarar a vida, a fé, a família, o trabalho, as relações, sem preconceitos nem medo;

 

procura em tudo ser coerente consigo mesmo, com as suas convicções, defensor da verdade em todas as situações e capaz de perdoar todas as incompreensões e ofensas;

 

diariamente ora a Deus no silêncio do seu coração e alimenta-se com a Sua Palavra, enquanto meios para resistir ao espírito do mundo;

 

não tem a pretensão de dar lições a toda a gente, mas apresenta-se de forma simples, aceitando que os outros sejam diferentes nas suas opções, perspectivas ou atitudes.

 

O jovem é testemunha da sua fé em Cristo sobretudo quando vive de forma alegre e feliz a sua condição de cristão. Por melhor que seja a mensagem e o testemunho, eles não passarão por um rosto triste e infeliz. A mensagem e a pessoa de Jesus Cristo são a fonte de toda a alegria e a origem da felicidade, pelo que é preciso experimentá-los, vivê-los, para partilhá-los.

 

Como diz o Papa na mesma Mensagem: “Também vós, se acreditais, se sabeis viver e dar cada dia testemunho da vossa fé, sereis um instrumento que ajudará outros jovens como vós a encontrar o sentido e a alegria da vida, que nasce do encontro com Cristo”. É o que desejo que te aconteça nestas Jornadas Mundiais da Juventude de Madrid.

 

Coimbra, 15 de Agosto de 2011

Virgílio do Nascimento Antunes

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