NOTA PASTORAL DO BISPO DE COIMBRA
ANO PASTORAL DE 2025-2026
No Espírito de Cristo está toda a nossa vida
Saudação
Dou graças a Deus pelo Plano Pastoral Diocesano que a Diocese elaborou e agora entrego nas vossas mãos. Ele é de todos e é para todos, uma vez que é da Igreja Diocesana e deve, por isso, conduzir-nos a intensificar os laços de comunhão profunda, efetiva e visível, que o Espírito Santo realiza em nós.
Creio que o Plano Pastoral nos vai ajudar a dar um novo impulso às comunidades cristãs, que, mais do que as suas estruturas organizativas, precisam de renovar o seu coração, a sua fé e a sua vida. Vai também ajudar a gerar “alma nova” nos cristãos que se encontrem fracos na fé e, porventura, desmotivados na participação e na ação.
Este Plano Pastoral, fruto de um longo amadurecimento comunitário, participado e partilhado, conduz-nos ao essencial da vivência da nossa fé em Jesus Cristo e pretende levar-nos à fonte da Vida, sem a qual podemos andar a correr em vão.
Entregamos o Plano Pastoral, a sua receção pela Diocese e todos os que, de forma humilde, mas entusiasta, desejam concretizá-lo com muita criatividade e ousadia nas comunidades, à proteção de Santa Maria de Coimbra. A fé obediente de Maria a Deus Pai, o seu amor materno a Jesus e a sua docilidade ao Espírito Santo, constituem para nós, cristãos, o modelo da vida espiritual a que somos chamados.
Objetivo do Plano Pastoral e as suas quatro linhas
A espiritualidade cristã consiste em levarmos o Espírito de Cristo a toda a nossa vida, ou seja, em tornarmos realidade em nós o mistério da comunhão com Cristo e com a Sua Igreja iniciado no batismo, que nos foi revelado na Palavra das Escrituras, que alimentamos na Eucaristia e que nos torna caminhantes da vida quotidiana como pessoas espirituais.
Viver a espiritualidade cristã: na comunidade como casa.
Toda a Espiritualidade cristã nasce no batismo pelo qual somos incorporados em Cristo e na Igreja para viver a vida nova, como refere o Apóstolo Paulo: “Pelo batismo fomos, pois, sepultados com Ele na morte, para que, tal como Cristo foi ressuscitado de entre os mortos pela glória do Pai, também nós caminhemos numa vida nova” (Rm 6, 4).
A comunidade cristã é a casa ou o corpo em que vivemos como filhos, por meio de Jesus Cristo, o Filho que nos une ao Pai, e conduzidos pelo Espírito Santo. Na comunidade cristã, na Igreja, temos a possibilidade de acolher e desenvolver a vida nova que já recebemos como dom.
A nossa espiritualidade é a do Espírito de Cristo, é a dos que foram enxertados no Seu Corpo, é a da comunidade dos filhos que chamam a Deus seu Pai, é a da Sua Igreja, a nossa casa de família.
Viver a espiritualidade cristã: na Palavra como revelação.
O conteúdo da espiritualidade cristã torna-se objetivo na revelação de Deus realizada pela encarnação de Jesus Cristo, a Palavra que veio habitar no meio de nós. O Verbo fez-se carne (cf. Jo 1, 1) e entrou na nossa história. As suas palavras e obras, o mistério da Sua Páscoa, o anúncio da Boa Nova da salvação, inspirado pelo Espírito Santo derramado sobre a Igreja Apostólica, continua a permitir-nos o acesso ao mesmo Senhor, fonte de vida.
Como Igreja que escuta a Palavra de Deus nas Sagradas Escrituras, temos a graça de conhecer e acreditar no mistério de Cristo que nos foi revelado, de acolher a mensagem de salvação do próprio Cristo e de responder com as nossas atitudes, gestos e palavras de fé.
A Palavra inspirada não nos deixa cair no erro do subjetivismo espiritual, mas leva-nos a compreender com verdade os caminhos da espiritualidade e da vida cristã que nos são revelados: “as coisas que são de Deus ninguém as conhece, a não ser o Espírito de Deus. Quanto a nós não recebemos o espírito do mundo, mas o espírito que vem de Deus, para podermos conhecer os dons da graça de Deus. E deles não falamos com palavras que a sabedoria humana ensina, mas com as que o Espírito inspira... nós temos o pensamento de Cristo” (1 Cor 2, 11-12.16).
Viver a espiritualidade cristã: na Eucaristia como alimento.
A Eucaristia, memorial da oferta de Cristo ao Pai para salvação da humanidade, leva o cristão a viver em cada tempo da história a condição de membro do Seu Corpo. Toda a espiritualidade cristã parte da Eucaristia, celebração do mistério pascal de Jesus e orienta para a Eucaristia, Pão partido e mistério de comunhão e de amor pela ação do Espírito Santo.
A Igreja não pode viver sem a Eucaristia, o mesmo é dizer, cada cristão e cada comunidade de batizados não pode crescer na vida espiritual, na vida nova dos filhos e filhas de Deus, sem o alimento do Corpo e do Sangue de Cristo, que realiza a comunhão de todo o corpo eclesial. Fomos constituídos como cristãos na Páscoa de Cristo e só no mistério pascal se realiza a nossa vocação de permanecer em Cristo como ramos unidos à verdadeira vide.
A espiritualidade cristã concretiza-se na Eucaristia, mistério acreditado, celebrado e vivido. Nela temos a graça de acolher o amor de Deus como um dom, de entrar na comunhão mais profunda com Deus e com os irmãos, de realizarmos a nossa vocação à fé, à esperança e ao amor, à maneira de Cristo.
Na Eucaristia encontramos a verdadeira vida que o Senhor nos dá por meio de Jesus, o Filho: “Eu sou o pão vivo, o que desceu do Céu: se alguém comer deste pão viverá eternamente; e o pão que Eu hei de dar é a minha carne pela vida do mundo” (Jo 6, 51).
Viver a espiritualidade cristã: no mundo como missão.
A espiritualidade cristã é sempre incarnada, ou seja, é presença do Espírito de Cristo plenamente transformadora da realidade humana, da carne, que nós somos. Deste modo, ela manifesta-se no novo modo de viver que irrompe em todos os que se deixam guiar pelo Espírito e tem consequências claras no exercício da nossa vontade, no conteúdo das nossas decisões, no estilo das nossas opções de vida, no sentido ético das ações que praticamos.
Quando o Apóstolo Paulo exorta os cristãos a oferecerem os seus corpos como sacrifício vivo, santo, agradável a Deus, num culto agradável a Deus, o culto espiritual (cf. Rm 12, 1), não está a encerrar a espiritualidade num espiritualismo desencarnado nem reduzido a um momento da vida cristã, mas está a alargar à totalidade da vida. De acordo com Bento XVI, trata-se de “permear cada aspeto da realidade do indivíduo... uma nova maneira de viver todas as circunstâncias da existência” (Sacramento da caridade, 71).
A vida espiritual é a vida no Espírito, dom recebido no batismo, experimentada na comunidade cristã, alimentada pela Eucaristia e comprometida com as realidades humanas. É, ao mesmo tempo, missão, porque desafio a transformar a própria vida e a trabalhar em favor da gestação da vida nova da humanidade.
Virgílio do Nascimento Antunes
Bispo de Coimbra