AS IGREJAS CRISTÃS E AS RELIGIÕES NÃO CRISTÃS FACE AOS DRAMAS DA ACTUALIDADE

Manuel Augusto Rodrigues

À parte a palavra autorizada do Papa Bergoglio e de alguns líderes religiosos verifica-se um silêncio quase absoluto no que concerne à cooperação das comunidades cristãs e das diversas crenças disseminadas pelo mundo relativamente às tragédias humanas e outras que se abatem um pouco por toda parte. As Igrejas cristãs lêem os mesmos textos sagrados e as crenças que o não são defendem valores altamente positivos e que urge explorar. Por isso tem-se levantado a questão: porque não se congregam os seus líderes ou representantes para estudar, traçar medidas e agir no terreno perante as desgraças que alastram a um ritmo impressionante? Será um sinal do desinteresse e a indiferença generalizados a que se tem referido Bergoglio, ele que fez questão de se deslocar a Lampedusa e ali, “in loco”, denunciou o drama que se vive no Mediterrâneo? Como interpretar os diálogos ecuménico e inter-religioso e a colaboração com os não crentes?
Decorre em Bari nos próximos dias 29-30 21 um colóquio internacional inter-cristão sobre “Cristãos do Médio Oriente: que futuro?”, concebido como a primeira cimeira inter-cristã para tratar do drama das minorias religiosas perseguidas no Médio Oriente, o colóquio alargou o tema à tragédia dos migrantes mortos no Mediterrâneo. O programa passou a ser “Cristãos nos países em guerra, minorias, massacres do mar”. Como afirmou o fundador da Comunidade de Santo Egídio, Andrea Riccardi, o horizonte não podia deixar de incluir uma imergência que parece não ter fim.
Na bula de proclamação do jubileu extraordinário da Misericórdia (“Misericordiae vultus”) há passagens que se prendem com o que vimos dizendo: a misericórdia de Deus que é eterna (Sal. 136) vem inculcada em várias parábolas evangélicas impregnadas de um sentido de humanismo admirável. “A arquitrave que suporta a vida da Igreja é a misericórdia”, diz a bula papal, que a seguir lembra a encíclica a “Dives in misericordia” de João Paulo II que tanto surpreendeu por ir ao arrepio da «mentalidade contemporânea que tende a separar da vida e a tirar do coração humano a própria ideia de misericórdia» que importa valorizar «nesta fase difícil e crítica da história da igreja e do mundo».
Francesco Occhetta e Paolo Benani escreveram um interessante artigo na “Civiltà Cattolica” de 21 de Março sobre “A política frente aos desafios do pós-humano” que inicia assim: «A crise actual da política não é simplesmente ligada à inércia ou incapacidade de gerir a complexidade dos temas em agenda, mas à desorientação causada por um novo modelo cultural que está substituindo o antigo. O que se está a destruir é o fundamento e a finalidade da acção política. As categorias do humanismo europeu, que colocavam a pessoa no centro da actuação política, já não são uma condição «pré-política» aceite por todas as forças no terreno. A «tábua dos valores» que a consciência de uma sociedade discerne e o Estado democrático reconhece não é agora unanimemente compartilhada».
À ideia de que os princípios éticos, políticos, religiosos e estéticos prescindem da metafísica e em oposição ao conhecido político italiano Flores d’Arcais que escreveu recentemente um artigo intitulado: «A democracia deve pedir o exílio de Deus», Bento XVI na encíclica “Veritatis splendor” esclarece com lucidez o conflito entre liberdade e lei, a faculdade de decidir acerca do bem e do mal e a liberdade de criar valores e mesmo a própria verdade à luz da autonomia moral e da soberania absoluta. Na “Populorum progressio” (1967, PP, 15) Paulo VI tratando do desenvolvimento sintetiza a doutrina social da Igreja: «Não basta limitar-se a considerações de ordem material e económica, política ou cultural, sem as incluir, e sem uma abertura espiritual e sem ter em linha de conta todos os homens e todos os povos….O tema do desenvolvimento cruza-se com os desafios da globalização e do ambiente. O conceito de desenvolvimento integral tem profundas raízes antropológicas e teológicas e a Igreja sente o imperativo de professar a fé cristã relativamente a questões do desenvolvimento de modo crítico e construtivo».
O precursor do tema do desenvolvimento foi João XXIII com as encíclicas “Mater et Magistra” (1961, MM) e “Pacem in terris” (1963, PT) que o Vaticano II na “Gaudium et spes” (1965, GS) viria retomar. Perante as desigualdades entre países economicamente desenvolvidos e países em vias de desenvolvimento (MM, 143) os três documentos referidos fornecem alguns princípios fundamentais. Paulo VI sistematizou os aspectos mencionados na (PP) e aponta a experiência dos católicos empenhados nos debates e na acção pelo desenvolvimento. Lembra o caso do dominicano francês Louis-Joseph Lebret (1897-1966) que fundou em 1941 a associação “Économie et humanisme” que tem em vista promover uma economia ao serviço do homem. Lebret foi consultor de vários governos da América Latina, África e Ásia e foi ele quem criou a noção de desenvolvimento integral de «todo o homem e de todos os homens». Na sequência do Vaticano II e tendo em consideração os sinais dos tempos o Papa exemplifica com o grito dos «povos da fome que hoje interpelam de forma dramática os povos da opulência» (PP, 3) e obrigam a reler os Evangelhos.
Face às dúvidas e incertezas que agitam o homem há que denunciar e transmitir com alegria a mensagem de esperança em colaboração com todos os crentes e não crentes. Segundo o Papa «um evangelizador não deve mostrar um rosto de funeral», ideia que traz à memória o que Nietzsche dizia no seu “Assim falou Zarathustra. Um livro para todos e para ninguém”: os cristãos têm, «cara de enterro», trazem consigo a morte, não a vida, o que é contrário ao que a Fé nos dita: os cristãos são testemunhas do Ressuscitado e não de um cadáver. Os anunciadores da Boa Nova devem anunciar a Beleza do tesouro que lhes foi confiado. O Papa Francisco tem tratado amiúde da importância da homilia e Bento XVI disse um dia: «Pobre Deus que todos os domingos deve sobreviver a milhões de péssimas homilias!». 

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