SOLENIDADE DO SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE DE CRISTO

A Eucaristia constitui a grande novidade da fé Cristã, o seu mistério e a sua maior riqueza. A Eucaristia é Cristo, a novidade de Deus comunicada ao homem, Aquele que revela o mistério escondido e ao mesmo tempo o mistério revelado, a fonte da salvação como a única riqueza que nos sacia.

A Igreja que somos, as comunidades cristãs, se querem fortalecer-se, evangelizar o mundo, transformar a sociedade e dar um testemunho credível da fé, têm um único caminho: tornarem-se comunidades eucarísticas num sentido total.

As leituras desta Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo ajudam-nos a fazer um percurso de compreensão deste mistério que nos envolve e oferecem-nos a linhas fundamentais de uma vida pessoal e eclesial verdadeiramente eucarística, enquanto marca específica da nossa condição cristã.

O texto do Livro do Êxodo, que escutámos e, de algum modo, todo o Antigo Testamento faziam-se eco de uma realidade que atravessa todos os tempos: o ser humano, na incapacidade de se oferecer em atitude de amor a Deus e aos outros, opta por oferecer aquilo que possui.

A religiosidade do Povo de Deus e a sua relação com o Deus da Aliança assentavam em grande parte na oferta dos sacrifícios de animais ou na oferta dos produtos da terra, num gesto de ação de graças e de louvor. Ainda hoje a religiosidade de muitas pessoas passa pela oferta dos seus bens, das suas orações de súplica ou de ação de graças, mas passa pouco pela oferta da vida num serviço real aos irmãos, à sociedade e a Deus.

A leitura da Epístola aos Hebreus ajudou-nos a compreender a atitude radicalmente diferente de Jesus, quando afirmou: “(Cristo) não derramou sangue de cabritos e novilhos, mas o Seu próprio Sangue, e alcançou-nos uma redenção eterna”, para depois acrescentar que “o sangue de Cristo que pelo Espírito eterno Se ofereceu a Deus como vítima sem mancha, purificará a nossa consciência das obras mortas, para servirmos ao Deus vivo!”

Nesta oferta do Sangue de Cristo ao Pai, que é a oferta da totalidade da sua vida, no amor, está a novidade da sua pessoa e do seu agir, que se torna programático para todos nós, homens e mulheres seus discípulos. Este é que é o mistério de amor de Deus manifestado por Seu Filho, o mistério redentor, que realiza a nossa salvação e nos aponta um caminho de vida e um estilo de vida, a que chamamos eucarístico.

O texto do Evangelho de S. Marcos centrava-nos na Última Ceia, que antecede a sua entrega à morte de cruz. Nesta Ceia, donde nasce a celebração eucarística que agora realizamos em sua memória e segundo o seu mandato, Cristo realiza de modo sacramental o que foi a sua vida de entrega até àquele momento e o que será a sua entrega nos momentos de paixão que se seguirão.

“Tomai: isto é o meu Corpo. Este é o meu Sangue, o Sangue da nova aliança, derramado pela multidão dos homens”, são as palavras pronunciadas, que exprimem o sentido de toda uma vida e, unidas aos gesto de entrega, realizam o mistério salvador.

Sempre que hoje celebramos a Eucaristia, atualizamos de forma sacramental e, por isso, real, essa oferta e os seus benefícios em favor da humanidade, revisitamos a novidade da fundamental do cristianismo, que é a oferta amorosa de Cristo ao Pai por todos nós.

Da Eucaristia nascem, caríssimos irmãos, as intuições centrais que hão-de inspirar a nossa vida de discípulos, de cristãos e de testemunhas de Cristo no mundo. Daqui nasce a novidade que há-de permear toda a nossa vida, o distintivo mais eloquente que nos há-de identificar no meio do mundo: a oferta de nós mesmos a Deus, numa atitude de amor, em favor dos irmãos. Daqui nasce a novidade da cultura cristã, que assenta no amor capaz de vencer todos os egoísmos; daqui brota a cultura do ser, que superará a cultura do ter; a cultura do dar em vez da do receber; a cultura do sacrificar-se pelos outros em vez de sacrificar os outros; a cultura do estar disponível para perder, quando se trata de fazer ganhar alegria e bem-estar aos outros.

Na atitude eucarística tem origem a radicalidade da fé cristã que leva muitos a entregarem-se no anúncio da Boa Nova tanto nas missões ad gentes como na ação eclesial local; outros a disponibilizarem-se para o serviço à Igreja na vivência dos conselhos evangélicos da pobreza, castidade e obediência; outros ainda no compromisso com a sociedade, tanto na política como no mundo do trabalho, na luta pelos direitos humanos ou pela justiça social. Na atitude eucarística tem origem a radicalidade de muitos casais disponíveis para constituir família segundo os critérios e os desígnios de Deus e da sua Igreja, assumindo as dificuldades do caminho ou mesmo os fracassos, como incentivos a um amor mais forte e a uma doação mais completa.

O grande desafio da Igreja que somos vai no sentido de desenvolvermos uma autêntica cultura eucarística. Havemos de passar de uma visão poética, desincarnada, espiritualista, da Eucaristia enquanto celebração e enquanto devoção, para a assumirmos enquanto realidade capaz de transformar a totalidade do nosso ser e do nosso agir: um só com Ele pela ação sacramental, como que cristificados; e um só com Ele na vida daí decorrente, homens novos e salvos, cristãos no sentido mais pleno do termo.

Neste dia solene, comprometemo-nos com o Senhor a celebrar na fé este grande mistério do amor e da redenção, pedimos-lhe que nos livre de todo o ritualismo estéril, que não nos deixa saborear a grandeza do mistério, e que faça de nós homens e mulheres eucarísticos na celebração, na adoração, na oferta da totalidade da nossa vida.

A Maria, confiamos a Igreja e cada um dos seus membros, a fim de que com o seu auxílio e proteção formemos um só corpo e um só espírito. Ámen.

 

Coimbra, Sé Nova, 7 de Junho de 2012

Virgílio do Nascimento Antunes

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