Rainha Santa - Homilia de Dom Virgílio

SOLENIDADE DA RAINHA SANTA ISABEL DE PORTUGAL

SANTA CLARA A NOVA – 2018.07.04

 

Caríssimos irmãos e irmãs!

Temos de novo a alegria de celebrar uma figura cimeira da vida da nossa nação portuguesa e da nossa Igreja Católica: Santa Isabel de Portugal, a Rainha Santa Isabel. Portugal e a Igreja, de um modo mais sentido a nossa cidade de Coimbra, têm muitas razões para entoar um magnificat de gratidão e de louvor a Deus, que suscita em todos os tempos grandes figuras capazes de inspirar e mobilizar toda a comunidade no sentido de responder mais fiel e adequadamente à sua vocação humana e cristã.

A vida dos santos é o Evangelho em ato, o Evangelho escutado, interiorizado e posto em prática dia a dia, numa busca constante da vontade de Deus como o melhor caminho de realização pessoal e comunitária. A vida dos santos é o amor de Deus acolhido e partilhado por pessoas comuns, mas imbuídas de uma fé capaz de as pôr no caminho do seguimento de Jesus, animadas pelo Espírito Santo e a sentir-se comunidade cristã ou povo de Deus.

Ainda há pouco tempo o Papa Francisco nos ofereceu uma Exortação Apostólica intitulada Gaudete ed Exultate – Alegrai-vos e Exultai – sobre o chamamento à santidade proclamado pelo Evangelho e renovado de forma eloquente pelo Concílio Vaticano II. Nele carateriza a vida cristã como uma vocação a seguirmos Jesus Cristo como Povo de Deus iluminado pelo Espírito Santo e realizando a nossa condição de batizados, ligados sacramentalmente Àquele que é o Santo dos Santos.

Em palavras simples, mas teologicamente extremamente profundas, diz: “Gosto de ver a santidade no povo paciente de Deus: nos pais que criam os seus filhos com tanto amor, nos homens e mulheres que trabalham a fim de trazer o pão para casa, nos doentes, nas consagradas idosas que continuam a sorrir. Nesta constância de continuar a caminhar dia após dia, vejo a santidade da Igreja militante. Esta é muitas vezes a santidade «ao pé da porta» daqueles que vivem perto de nós e são um reflexo da presença de Deus”, ou – por outras palavras – da «classe média da santidade»” (GE 7).

Deste modo, o Magistério da Igreja traz para a ordem do dia um estímulo a todo o cristão que, com sacrifício de si mesmo, mas igualmente com imensa alegria, procura fazer da sua fé uma vida, procura tornar a sua esperança uma realidade e procura tornar a caridade um ato contínuo. As virtudes passam, assim, de um ideal ou de uma utopia a uma vida situada no espaço e no tempo de cada pessoa e de cada comunidade de discípulos. As pessoas comuns, qualquer que seja o seu estado de vida e a sua vocação específica, tornam-se verdadeiramente reflexo da presença de Deus e, por isso, testemunhas da grandeza do seu encontro com os homens, sempre misterioso, amoroso e transformador. Pessoas normais e de todas as condições não passam, porventura, a ser heróis, mas continuando pobres e pecadoras, tornam-se sinais da santidade de Deus que, por meio do seu Espírito renova os corações.

As leituras que acabamos de ouvir apontam-nos os sinais mais visíveis e mais reais da santidade que somos convidados a manifestar ao mundo enquanto cristãos, que acolhem o dom do amor de Deus, por meio de Jesus Cristo, o Filho Unigénito enviado ao mundo para que vivamos n’Ele.

A Primeira Epístola de São João afirmava que todo o amor vem de Deus e que todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece a Deus. Estamos diante da afirmação fundamental da nossa fé, que é muito mais do que uma religião que se cumpre, pois tornou-se uma relação que se vive quotidianamente de forma simples e autêntica.

O encontro pessoal com Cristo que está na origem de uma relação nova e transformadora, leva-nos ao conhecimento de Deus e conduz-nos a uma relação luminosa com os irmãos. Esta é a marca mais caraterística do que somos enquanto cristãos, que supera o vazio de tantas manifestações exteriores a que facilmente nos apegamos e que tão facilmente tranquilizam as nossas consciências.

Todo o encontro pessoal com Cristo no amor ao mesmo Cristo converte e transforma o coração e a mente, leva ao conhecimento de Deus e aproxima dos irmãos. Eis o primeiro e maior desafio que nos é feito e o maior dom que nos é dado.

Ainda a mesma Epístola de São João nos dava uma outra certeza essencial para o nosso caminho de santidade: Deus deu-nos o Seu Espírito. Esta certeza da presença do Espírito em nós é essencial para que possamos progredir no caminho da santidade cristã. Primeiro porque não podemos progredir no amor a Deus e aos outros sem o auxílio do Espírito de amor; depois, porque a obra de santificação não é uma conquista humana, mas um dom que vem de Deus e que nos cabe acolher com humildade.

O segundo grande desafio que esta celebração nos propõe é o do amadurecimento espiritual, que nos leva ao crescimento no amor. Muito facilmente nos tornamos pessoas mundanas, que vivem mais dos critérios humanos e sociais do que do discernimento espiritual. Se não damos lugar ao Espírito de Deus, pode acontecer que nos deixemos enredar por aparentes expressões de amor e de verdade sem que nos encontremos com o amor que Deus é e com a verdade que nos revela.

Os caminhos do amadurecimento espiritual incluem sempre a escuta da Palavra de Deus, a celebração comunitária dos sacramentos, a participação na vida da comunidade cristã, a oração confiante na qual damos graças a Deus por tudo e na qual nos abrimos aos seus caminhos com humildade. Se queremos progredir na santidade cristã, havemos de nos pôr diariamente diante da mais humilde e transformadora interrogação: Senhor, que queres que eu faça? E o Espírito Santo nos levará ao discernimento acerca do bem, da verdade, do amor e da justiça, que nos hão de descentrar de nós mesmos para nos centrarmos na vontade do Pai, à maneira de Jesus.

 A profecia de Isaías e o Evangelho segundo São Mateus, numa linguagem verdadeiramente profética, apontavam-nos a via da caridade como a via da santidade: “tive fome e destes-me de comer; tive sede e destes-me de beber, era peregrino e me recolhestes; não tinha roupa e me vestistes; estive doente e viestes visitar-me; estava na prisão e fostes ver-me”.

Esta é a linguagem que deixa desarmado todo o que não tem caridade mas, porventura, se tem por religioso, afirma ter fé, ou garante que é verdadeiramente humano. Diante da falta de caridade caem todos os argumentos em favor da santidade; mas a caridade em ato é o testemunho mais claro da fé e da santidade que o Espírito de Deus realiza nos que O acolhem de coração sincero.

Agradeçamos ao Senhor que nos dá a graça de crescer na fé, de progredir no amadurecimento espiritual e de viver na caridade, seguindo o grande mas simples exemplo de Santa Isabel de Portugal. Agradeçamos ao Senhor por nos ter chamado à mais bela vocação, a de sermos santos como Ele é santo.

Coimbra, 4 de julho de 2018
Virgílio do Nascimento Antunes
Bispo de Coimbra

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